1973 - Hepatite C, a doença que dizimou um time inteiro do Gaúcho

De Futebol de Passo Fundo
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*Por Marco Antonio Damian, escritor e pesquisador de futebol

Era comum até a década de 1980 a utilização de algumas doses de glicose em jogos de futebol. Não apenas em pequenos clubes do interior, mas até mesmo entre os craques da dupla Grenal. Lembro de uma reportagem no jornal Zero Hora em que o grande Larry Pinto de Farias detalhou o que ocorria dentro dos vestiários. Até mesmo em treinos os jogadores se utilizavam do uso de substâncias químicas.

Aqui não era diferente. O Gaúcho tinha um funcionário, um enfermeiro, chamado Napoleão Ribas. Era uma pessoa bondosa, havia sido funcionário do Serviço de Assistência Médica e Domiciliar de Urgência (Samdu) e tinha um ambulatório no centro da cidade, onde aplicava injeções e fazia curativos. Era muito procurado por homens que contraíam doenças venéreas. Quando acontecia, corriam no ambulatório do Seu Napoleão. Saiam com o braço dolorido por causa da Benzatacil. Evidentemente que, na época, não existiam seringas descartáveis. A mesma agulha era utilizada em vários braços e veias. Entre um e outro, passava por um prosaico esquema de assepsia. Um recipiente de água fervente. Seu Napoleão era singelo demais para imaginar que essa prática poderia um dia levar seus clientes à morte.

Seu Napoleão tinha seu estoque de Thiaminose e de Glucoenergan. Especialmente esta última dava uma imediata dose extra de energia. E, antes dos jogos, os jogadores pediam para tomar a injeção, para renderem mais em campo. Isto se transformou num vício. Tinha jogador que não entrava em campo sem a injeção. Caso contrário se arrastava no gramado.

E assim foi indo. As injeções sendo aplicadas na veia de “a” e logo após na veia de “b” e assim por diante. Se, algum atleta estivesse acometido de alguma hepatite, naturalmente a doença passava a outro. Simples assim.

O Gaúcho de 1973

O ótimo time do Gaúcho de 1973 formava com Carlos Alberto, Gringo, João Pontes (Lívio), Daizon Pontes e Luiz Carlos; Raul Matté e Paraná; Leivinha, Luiz Freire, Bebeto e Serginho. Alguns anos depois de encerrarem as carreiras, quase todos esses jogadores foram diagnosticados com a hepatite C, doença que se transforma em cirrose, passando logo após para câncer de fígado.

Nesta escalação, as exceções foram Daizon Pontes, que, em toda sua carreira, conforme ele próprio afirmava, jamais tomou injeção para jogar e Luiz Freire, que passou incólume pela seringa do Seu Napoleão. Não há notícias sobre Paraná. Os demais faleceram com a mesma doença. Inicialmente, um enorme sofrimento, um tratamento quase desumano e depois a morte.

Além deles, sabe-se que o goleiro Nadir, o meia Roberto, os zagueiros Brito e Raul Santos, o volante Paulo Ferro, o lateral Betinho, os centroavantes Ivan, Ilo e Cid, e os pontas Ademir e Mariano, infelizmente, tiveram o mesmo destino.

Vítimas desta nefasta doença e pela ingenuidade de pessoas que desconheciam o perigo.